domingo, 30 de setembro de 2012

A Teoria do Nada



“(...) o que normalmente consideramos como o espaço vazio – o vácuo, o nada - desempenha um papel central na determinação da aparência atual das coisas (...)”
Brian Greene


Atente para o nosso universo em grande escala: imensos vazios com aglutinações de matéria bastante espaçadas, ao menos na parte visível que conhecemos.

Analisando a matéria em diminutas escalas chegamos à conclusão de que as moléculas e átomos não possuem substância, não são sólidos ou pequenas esferas como é comum imaginarmos. Alguns ainda concebem, de forma enganosa, uma estrutura atômica de prótons, nêutrons e elétrons como um pequeno sistema planetário. Estas concepções mentais são falsas.

Uma imagem mais aproximada nesta escala de observação seria de regiões com altas probabilidades de se encontrar as estruturas básicas, inclusive o próprio átomo, em contraste grandes espaços de baixíssima probabilidade de encontrar os mesmos. É como se fosse uma nuvem no céu, dessa que imaginamos diversas formas ao olharmos para as mesmas: montes de algodão. Quanto mais escura maior a probabilidade da água estar concentrada na região e, em consequência, mais densa é a nuvem nesta zona. De maneira similar, as “nuvens atômicas” também possuem densidades e estas definem a região do espaço onde a partícula subatômica tem maior probabilidade de ser encontrada.

Com efeito, o átomo é formado por regiões volumétricas de alta e de baixa probabilidade de se achar seus componentes fundamentais. A física quântica, grosso modo, é uma física depossibilidades.

Em geral, não há contato físico entre os átomos ou moléculas, não da maneira convencional que imaginamos. As ligações são elétricas, atrações entre as cargas de sentidos opostos. A natureza mais íntima da matéria se mostra um imenso vazio quando olhada de perto.

Uma boa definição para o que chamamos de partículas subatômicas, os tijolos da realidade física, seria um condensado de informações, ou de ideias. Um elétron é definido por seu spin, carga e massa: um conjunto de informações percebidas pela interação que este tem com outras partículas.

Uma das coisas que mais perturbam os materialistas é um fato difundido e amplamente explorado nos experimentos quânticos: a fundamental importância da medição interferindo no evento observado.

Em grande escala, ao medirmos a velocidade e posição de um objeto, como um carro, não alteramos ou definimos estas informações. Quando o tempo de uma volta de um carro de fórmula 1 é apresentado no programa de televisão que cobre o evento, a posição e a velocidade do mesmo não sofre qualquer perturbação fruto da medida feita. Nada parece ter se alterado como consequência da medição realizada. Isso não ocorre nos experimentos subatômicos.

Um evento quântico não é precipitado, ou seja, vem a ter existência física, enquanto não é medido. Antes da medição o fenômeno se encontra em meio a possibilidades da realidade. Quando se mede, uma única alternativa dentre todas as possibilidades passa a fazer parte da realidade daquele momento e todas as outras probabilidades de existência são reduzidas a 0% de chance de acorrerem fisicamente.

Tal fato ocorre de forma tão fantástica que um só elétron pode estar em vários lugares em dado instante antes de uma medição qualquer. Contudo, uma vez que este elétron tenha sua posição medida, no instante da medição, sua alocação passa a ser um lugar definido e único.

O domínio da mecânica quântica nos mostra fatos deveras anômalos em relação a nossa vivência cotidiana. Como exemplo, a experiência conhecida como escolha retardada mostra que um evento medido pode definir a posição, ou posições, que uma partícula adotou antes da medição, ou seja, uma decisão que tem afeitos naquilo que entendemos, de forma contumaz, como passado.

Esta linha de pensamento levou o físico Amit Goswami a construir uma teoria que a mente figura como responsável pela criação de nossa realidade, inclusive da matéria.

Dentre as similitudes que percebo entre a cabala e a física, há uma que considero de forma especial. A dinâmica que caracteriza nosso universo e a vida são características indispensáveis à visão de quem os estuda. Pode-se dizer que nada é, tudo está. Este é assunto para outro texto.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Nada


Ora, o não ente ao qual nos referimos é justamente o nada, pois o nada é aquilo que é nenhum ente: “Ora, nada (nilhil) significa nenhum ente (nullum ens)” [1]. E o não-ente, que é o nada, é o que não possui o ser. Por isso diz o Aquinate: “Assim, se se considera a emanação de todo ente (emanatio totius entis universalis) a partir do primeiro princípio, é impossível que algum ente seja pressuposto (aliquod ens praesupponatur) a esta emanação (emanationi)”3. Desta feita, a criação consiste na emanação de todo o ser das coisas da sua causa universalíssima, a saber, Deus, e esta produção singularíssima dá-se a partir do nada, isto é, de coisa alguma: “(...) assim também a criação (creatio), que é a emanação de todo ser (emanatio totius esse), é a partir do não ente (ex non ente), que é o nada (quod est nihil)”[1].[2]

Pois, diz Agostinho: fazer é produzir o que antes de nenhum modo existia; ao passo que criar é constituir alguma coisa, tirando-a do que já existia [3].

Por onde, assim como o homem é gerado do não-ser, que é não-homem, assim também a criação, que é a emanação do ser total, procede do não-ser que é o nada [4].

"... a energia do universo deve permanecer constante. Isso é necessário para fazer com que o universo seja um local estável - para fazê-lo de tal modo que as coisas não apareçam simplesmente do nada. Se a energia total do universo deve permanecer nula, e se é necessário energia para criar um corpo, como todo um universo pode ter sido criado no nada? ... Como a gravidade é atrativa, a energia gravitacional é negativa..." [5]




Pensei em colocar a definição de nada, que conste em algum dicionário, no início deste texto, mas acho que não contribui muito com a finalidade aqui pretendida.

A palavra nada, em seu sentido irrestrito, aplicada em toda sua amplitude, leva à inexistência absoluta: remova matéria, energia, campos, espaço, tempo, exclua tudo para fazer jus ao termo.

Todavia, de forma restrita, é certo que, em dados contextos, nem sempre explícitos, nada é empregado para mostrar a ausência de um (ou um conjunto específico de) elemento(s) ou qualidade(s), como, por exemplo: Fui à loja e não tinha nada lá! Não vejo nada naquela pessoa.

Em termos físicos, o nada no conceito filosófico absoluto, até onde se sabe, não existe: é conceitual. Analisemos, de forma simplificada, a questão. Se existe um universo, então existe algo, logo não se pode aplicar aquele conceito geral de nada. Ainda que nos restrinjamos, imaginando, por exemplo, uma pequeníssima porção do nosso universo, mesmo assim o termo só pode ser aplicável com o sentido de vácuo, de espaço vazio. Mesmo este último pode sofrer certa variação face às descobertas científicas modernas. Isso pode ser verificado em citações como:
"Os conceitos de espaço vazio e de nada, da ausência total de tudo, tomam um sentido inteiramente novo quando a mecânica quântica entra em cena."
Brian Greene, O Tecido do Cosmo.

Aqueles que já leram sobre o fenômeno da flutuação quântica sabem que no vácuo do espaço profundo, além do espaço-tempo (que já é algo), ainda existe, em nível subatómico, uma intensa e frenética atividade de campos (gravitacional, eletromagnético, etc.).

Para um teísta cujo conceito de Deus esteja ligado a eternidade (dentre outros), parece-me ser impossível aplicar nada em sua amplitude plena. Um ser eterno já descaracteriza essa possibilidade. E, ainda, se Deus for tomado como onipresente, mais contextualizada ainda se deve aplicar a palavra nada. Ou seja, para um cristão, o nada estará contextualizado caso não seja uma discussão filosófica meramente de conceitos.

Assim sendo, para evitar confronto de conceitos, a aplicação do termo nada associado a Deus, como, por exemplo, Ele criando do nada, deve ser entendido num sentido restrito, algo como: nada que conheçamos ou concebamos.

Algo próximo, ou, talvez, propriamente dito, é tido no budismo ao se referir ao nirvana. Este termo pode ser compreendido como “apagamento”, “extinção”, que passa a ser meta da prática da filosofia de Buda: “...não deve ser entendido como aniquilação, mas sim como entrada em outra forma de existência.” [6].

Isto posto, pode-se melhor compreender a explicação do termo Ein Sof (cabala): “Antes que qualquer forma tivesse sido criada, Deus estava só; sem forma e semelhante a nada. E porque o homem não é capaz de conceber Deus como Ele realmente é, não lhe é permitido representá-Lo, nem em pintura, nem por Seu Nome, nem inclusive por um ponto.” [7].


[1]TOMÁS DE AQUINO. Suma TeológicaTrad. Aimom- Marie Roguet et al. São Paulo: Loyola, 2001. I, 45, 1.

[2] O Deus Criador em Tomás de Aquino, de Sávio Laet de Barros Campos

[3] Contra adversarium legis et prophetarum, lib. I, cap. XXIII.

[4] Suma Teológica, São Tomás de Aquino

[5] O Grande Projeto - Stephen Hawking e Leonard Mlodinow

[6] Coleção Para Saber Mais, Super Interessante, Buda, de Caco de Paula.

[7] O Zohar, O Livro do Esplendor, passagens selecionadas pelo rabino Ariel Bension.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A Queda


Compare as ilustrações que utilizo na gradual construção da Árvore da Vida, quando apresento três triângulos, e da Árvore propriamente dita. Na primeira, todas as Tríades apontam para cima (um dos vértices sobre os outros dois). Na segunda, duas estão invertidas. Isso é proposital é tem uma explicação.

Lembra-se do mito do Pecado Original? Não vou me alonga em termos filosóficos no assunto, mas vou apresentar minhas conclusões. Esta inversão parcial vista nas figuras é fruto de uma postura (voluntário ou induzida) da criação. A representação com todos os triângulos iguais e para cima significa que a criação está voltada para o “alto”, seu Criador. O raciocínio análogo é válido: a inversão de dois triângulos significa o desligamento, ou algo próximo a isto, da criação para com o Criador.

Quando nós, na condição de criaturas, passamos a nos iludir com a assimetria, atiramo-nos em uma ilusão de tal ordem, uma overdose da assimetria, que há uma recusa em buscar a ligação universal. Assim, tem-se uma ruptura com o princípio, a mente que tudo forma.

Há duas consequências para esta nossa atitude. A primeira é a perda de percepção quanto à ligação indissolúvel de causa e efeito, no sentido que estes são fruto de perspectivas de observação. Isto implica em ver Biná e Chochmá, representando a informação e a matéria, de formas distintas e não unidas, como uma remoção de Ketér.

A Árvore da Vida é muito feliz nessa representação, pois, com a inversão da Tríade Intermediária, há espaço para mais uma esfera entre as duas Tríades Superiores. Nesse espaço, alguns desenhos trazem a não-sephirah conhecida como Daat, que significa conhecimento.

O efeito direto desta nova assimetria no universo físico é a existência do tempo, tal e qual o percebemos (clássico e moderno). Para todos os efeitos, Daat é uma força similar às outras que constam na Árvore da Vida. Mas é percebida devido a uma ação que, em primeira análise, poderia não ser tomada pelo homem (como criação). Alguns autores defendem que nós substituímos Deus, representado por Ketér, por um falso Deus, Daat, ao tomar tal decisão.

A outra consequência é mais rara de ser representada em gravuras da Árvore da Vida. Desvinculando causa e efeito de sua ligação natural primeira, os agentes livres da criação (nós, seres-humanos) passamos a admitir que somente os eventos futuros - efeitos - estão relacionados à causa. Com esta interpretação e considerando a variação de agentes e interações existentes em Assiá, num dado instante, o futuro não parece estar escrito.

Desta forma, planos são feitos, desejos alimentados e, assim, a imaginação alça grandes voos. Lembrando que a criação é um produto mental, com nossa “mente pessoal” como uma pequena fração, esta multiplicidade gera um produto, um resíduo. Mas, como pode ser percebida em nossas experiências cotidianas, dentre as várias hipóteses que imaginamos decorrerem de uma determinada situação, uma só é vivenciada por nós. As outras não se cristalizam em Assiá. Grosso modo, tais subprodutos são como corpos sem alma, são cascas. Na cabala, este domínio é denominado por Clipot, cujo significado é, exatamente, cascas.

Há duas representações clássicas para Clipot nas ilustrações que a adotam na Árvore da Vida. Uma configura uma sombra por trás, ou abaixo, de Malchut. A outra exibe uma sombra de todas as 10 sephirot, uma Árvore de Sombras.

domingo, 16 de setembro de 2012

Por que a ciência não consegue enterrar Deus


Por John C Lennox.
Editado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.




Opinião
Um livro empolgante em sua leitura, bem escrito, com bons argumentos e referências. Não foge dos embates principais, apresentando soluções solidamente elaboradas para os pontos que muitos ateus apontam como base para não se crer em Deus. De quebra, rebate, com bom humor e inteligência várias das construções intelectuais e citações de famoso ateu Richard Dawkins (dentre outros). Uma obra para protestantes e católicos... ou melhor: teístas ou ateus.


Mais sobre o livro

Por que existe algo em vez de nada?

É com a apresentação de respostas a perguntas como esta, as quais são a base de todas as dúvidas, que o autor direciona sua obra. Lennox argumenta, utilizando-se de bons fundamentos, que a ciência nasce no seio religioso, sobretudo no cristianismo. Ele mostra como cientistas que construíram e alavancaram o nascedouro da ciência tinham a religião como um pilar pessoal e, até, aponta onde se verifica na Bíblia incentivo à busca por conhecimento da natureza intima da existência (física). Sobretudo, a ciência nasce pela crença, pelo sentimento, de que há um racionalismo por traz dos eventos que observamos no universo e, ainda, que tal construção inteligente é passível de ser por nós, humanos, entendida.

Com estrema habilidade, mostra que, diferente do que alguns ateus gostam de declarar, a ciência não leva ao ateísmo, mas sim essa é usada por parte deles numa apropriação indevida.

Há, de fato, cientistas que estão numa cruzada contra a religião e Deus, mas isso não significa que a ciência esteja em tal cruzada.

Para isso ficar claro, Lennox afirma sobre sua obra: “A questão central neste livro, no fim das contas, é, em essência, uma questão de visão de mundo: que cosmovisão se coaduna melhor com a ciência – o teísmo ou o ateísmo? A ciência sepultou ou não Deus? Vejamos aonde as evidências vão dar.”

Diante da argumentação de R Dawkins de que toda fé é uma fé cega, o autor argumenta (e mostra o motivo) de que “a fé é uma resposta a evidências, não um alegrar-se na ausência de evidências”.

O livro percorre caminhos que, para alguns, seriam espinhosos, como: a relação de Galileu com a Igreja Católica Romana; e o debate Huxley-Wilberforce, em Oxford.

Lennox mostra a militância radical ateia, a qual gosta de se apropriar da ciência para, a qualquer custo, descartar uma possível hipótese de existência de Deus. Isso fica claro, por exemplo, em citações como de Richard Lewontin, geneticista da Universidade de Harvard: “Não é que os métodos e as instituições científicas de algum modo nos obriguem a aceitar uma explicação material do mundo dos fenômenos, a criar um aparato de investigação e um conjunto de conceitos que produzam explicações materiais, por mais contra intuitivas que sejam, por mais difíceis de compreender que sejam para os não iniciados. (...) Além disso, o materialismo é absoluto, pois não podemos permitir um pé divino na porta.” Isso não é ciência, mas cientificismo.

O autor chama atenção para o fato de que “não deveríamos confundir os mecanismos pelos quais o Universo funciona nem com sua causa nem com aquele que o sustenta.”.

Talvez o melhor resumo do livro seja uma citação de Richard Swinburne: “Não estou postulando um ‘Deus das lacunas’, um deus só para explicar as coisas que a ciência não explicou. Estou postulando um Deus para explicar por que a ciência explica; não nego que a ciência explique, mas postulo Deus para explicar por que a ciência explica.”.

Essa postura se choca coma opinião de parte dos ateus, em especial de R Dawkins, de que a religião é uma espécie de alternativa a aquilo que a ciência vem explicando.

A obra percorre, ainda o problema da existência da matéria, da vida na Terra, da mente, bem como da sintonia fina das constantes cosmológicas e do multiverso. Em alguns dos contra-argumentos utilizados para desmontar “teses” ateístas, Lennox recorre à matemática para apontar diversas improbabilidades.

Um capítulo muito interessante é dedicado à informação e à incerteza. Achei todos os argumentos de Lennox bem elaborados e, até, surpreendentes. A habilidade que ele se utilizada da teoria da informação para demonstrar sua argumentação é arrasadora. Essa linha de raciocínio, de forma direta ou indireta, leva a enxergar certos ridículos, como fica claro no capítulo intitulado A Máquina dos Macacos (que coloca, novamente, R Dawkins em maus lençóis).

Eu diria, ainda, que uma das grandes evidências que o livro aponta está resumida na citação: “... um materialismo a priori pode produzir uma atitude profundamente anticientífica – uma relutância em seguir as provas aonde elas conduzem, apenas por não gostar das implicações de fazê-lo.”.

Deixo, por fim, uma citação de Lennox na obra aqui comentada: “Argumentar que as leis da natureza impossibilitam nossa crença na existência de Deus e em sua interferência no Universo é claramente uma falácia. Seria como alegar que o entendimento das leis que regem o comportamento do motor de combustão interna impossibilita a crença de que o projetista do carro, ou um de seus mecânicos, pudesse interferir ou interferisse, removendo a tampa do cabeçote.”.

Mais comentários na Folha.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Mente vs Cérebro


Qualquer teoria física é sempre provisória, no sentido de ser apenas uma hipótese: nunca é possível prová-la. Não importa quantas vezes os resultados dos experimentos estejam de acordo com alguma teoria, você nunca poderá ter certeza de que, na próxima vez, o resultado não a contradirá. Por outro lado, você pode desacreditar uma teoria encontrando uma única observação que
seja discordante de suas previsões.
Stephen Hawking

Há indício ou prova de que a mente exista independente das atividades neurais? Procuremos exceções à regra dominante aceita pelos acadêmicos. Não é de se esperar uma abundância de experiências e artigos que colimem com minha busca. A ciência oficial tem uma posição quase dogmática sobre a inteira dependência da mente em relação ao cérebro. Qualquer cientista que publique algo contrário, sem evidências incontestáveis, está fadado ao descaso e certo desprezo dos companheiros de profissão: uma verdadeira inquisição moderna, um limbo acadêmico.

Mesmo assim, os trabalhos vindos de artigos científicos são capitais. A costura de ideias que apresento como teoria é também estabelecida por indícios físicos e apoiada em alguns fatos provados.

Uma destas raras matérias científicas que apresentam constatação de atividade mental em pessoas cujo sistema nervoso central estava desprovido de qualquer impulso nervoso é apresentado no artigo do médico Pim Van Lommel, cardiologista do Hospital Rijnstate, em Arnhem, Holanda [1]. A experiência publicada cita compilações de casos de doentes clinicamente mortos, entenda-se “sem impulsos nervosos”, que, após terem a consciência restaurada, traziam relatos do período em que eram considerados mortos. O cardiologista holandês deu um tratamento científico ao caso.

O médico Sam Parnia, do Hospital Geral de Southampton, no sul da Inglaterra, foi um dos chefes da pesquisa feita em 10 hospitais holandeses onde foram observadas 1500 pessoas das quais pelo menos 63 relataram a experiência da quase morte. Os pacientes observados ficaram de 15 segundos a 43 minutos clinicamente mortos.

O artigo mostra relatos de atividades de diversas pessoas, nos hospitais em que estavam ou fora destes, no mesmo período em que os pacientes eram considerados clinicamente mortos. Alguns dos fatos descritos, devido a natureza passível de registro, inclusive fora do hospital, puderam ser comprovados.

O trabalho em apreço foi fonte de alguns documentários. Em um destes, exibido pelo canal Discovery, o Dr Peter Ferwick, neurologista e neuropsiquiatra, nos afirma: “Numa parada cardíaca, monitorando o cérebro, verá que a atividade deste cessa em até 8 segundos, se desativa. A neurociência nos mostra que não há experiência sem função cerebral. Então, quando o cérebro para, toda experiência cessa. Se por algum motivo não cessar, podemos afirmar que a mente e o cérebro não são a mesma coisa”.

Dentre vários relatos, o mais impressionante é o de Pam Reynolds. Sobre o caso, o Dr Michael Sabom - Atlanta, Georgia, cardiologista, declara: “Se fosse possível fazer uma experiência de laboratório em que se pudesse levar alguém ao limiar da morte, ou até mesmo a morte, e trazer essa pessoa de volta e perguntar do que se lembra, o caso de Pam Reynolds seria o mais próximo dessa experiência.” Pam Reynolds tinha um grande aneurisma cerebral. O primeiro neurologista que ela consultou não lhe deu esperança. Então, ela foi ao Barrow (ou Arrow) Neurological Institute. O Dr Robert Spetzler, neurocirurgião, contrariando os prognósticos, resolveu assumir o caso. Ele descreve a cirurgia como muito delicada, pois:
- a temperatura corporal da paciente foi reduzida, ficando entre 10ºC e 15ºC;
- seu coração e respiração foram parados; e
- sua função cerebral cessou, em até 8 segundos após a parada cardíaca, e todo o sangue foi retirado da sua cabeça.

Ela tinha de estar clinicamente morta durante toda a cirurgia. Antes desse “trauma”, o paciente é anestesiado, sua vista é coberta e dispositivos são colocados no seu ouvido para monitorar o cérebro. O paciente é completamente coberto, exceto o crânio, a área que sofrerá intervenção.

Hoje a Sra Reynolds afirma só se recordar da preparação antes de entrar na sala. A próxima recordação dela é de um som gutural, como uma broca, e de sentir o topo da cabeça formigando. Em seguida ela relata costumeiros “efeitos especiais”, como luzes, sensação de leveza e paz. Os céticos contrários a quebras de paradigmas mostram artigos em que estas sensações são aclaradas pelas pesquisas científicas. Por este motivo, sendo bastante conservador, assumamos que esta parte do relato é mera reação do organismo, nada de metafísico.

A coisa fica interessante quando a Sra Reynolds descreve os instrumentos, bastante incomuns e específicos, usados pela equipe cirúrgica em sua operação. Ela presumira que abririam seu crânio com “uma serra”, mas diz, espantadamente, que usaram algo similar a uma furadeira: descreve as brocas e caixa de ferramentas onde estas estavam guardadas. A pesquisa confirmou que se tratava de uma pequena serra circular, vista na documentação oficial da cirurgia e foto, de estética similar à indicada pela paciente.

Ela afirma que uma das médicas falara que as artérias da Sra Reynolds eram pequenas: “Parecia que eles estavam mexendo muito embaixo. Eu lembro de pensar: o que estão fazendo? É uma cirurgia no cérebro. Eles iam retirar o sangue das artérias femorais. Não entendi isso.”. Com precisão, ela relata a conversa entre os cirurgiões que iriam ligá-la à máquina “coração-pulmão”, dentre outras.

O Dr Michael confrontou o relato da Sra Reynolds com o relatório oficial da cirurgia. Existe uma correlação perfeita entre ambos. Existiam instrumentos que até o Dr Michael desconhecia, descritos pela paciente. Ele achou ridículo quando ela descreveu um instrumento como uma “escova elétrica”.

Pediu uma foto para ver o material e, espantado, revelou que parecia mesmo com uma escova elétrica.

O Dr Spetzler não acha possível que ela tenha visto os instrumentos cirúrgicos na sala de cirurgia. Nas palavras do próprio: “A broca, por exemplo, estava guardada. Estava tudo coberto dentro das embalagens. Só abrimos as embalagens com o paciente dormindo para manter o ambiente estéril.”. Sobre
o que foi ouvido, ele diz: “Nesse estado da operação ninguém pode ver ou ouvir coisa alguma, e me parece inconcebível que ela tenha ouvido. Fora isso, havia dispositivos em seus ouvidos. Seria impossível ela ouvir.”. E continua: “Não tenho explicação para o que aconteceu. Não sei como aconteceu, considerando o estado fisiológico dela. Mas já vi tantas coisas que não posso explicar. Não sou arrogante a ponto de dizer que não pode ter acontecido.”.

O Dr Michael conclui, por esses fatos, que houve uma percepção extrassensorial, ou experiência extracorpórea.

Para os fatos descritos nesta publicação científica, a teoria acadêmica vigente não tem resposta. Um único artigo é pouco para se tirar uma conclusão segura. Porém, o fato de permanência da percepção do “eu” mesmo sem qualquer atividade nervosa leva a uma conclusão: o cérebro também não é a fonte que caracteriza nosso “self“, nosso “eu”.

Nesta linha de pensamento, o cérebro é um órgão interpretativo, um receptor-transmissor, capaz de fazer a interação homem e meio. Isso evidencia que não somos cérebro ou parte deste. Não é a essência do ser humano, não é o que produz a sensação do “eu”.

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[1] The Lancet, Volume 358, Issue 9298, Pages 2039 - 2045, 15 December 2001; Near-death experience in survivors of cardiac arrest: a prospective study in the NetherlandsDr Pirn van Lommel MD, Ruud van Wees PhD, Vincent Meyers PhD, Ingrid Elfferich PhD

domingo, 9 de setembro de 2012

Contrapontos a alguns argumentos do livro: O Grande Projeto


Neste texto, exponho minha divergência de opinião sobre algumas passagens do (excelente) livro citado acima, dos físicos Stephen Hawking e Leonard Mlodinow.

1. “Embora sintamos que podemos escolher o que fazer, nossa compreensão da base molecular da biologia mostra que os processos biológicos são governados pelas leis físicas e da química. E que, portanto, são tão determinísticos quanto as órbitas dos planetas. (...) É difícil imaginar como o livre-arbítrio poderia operar se nosso comportamento é determinado por leis físicas. Assim parece que somos apenas máquinas biológicas e que o livre-arbítrio não passa de uma ilusão.”.

Vou ser bastante breve neste ponto, uma vez que já apresentei dois textos ("livre-arbítrio é uma ilusão?" e "onisciência e livre-arbítrio") que tratam das principais âncoras (teóricas) da citação acima. Analisemos, rapidamente, dois aspectos, um subjetivo e outro objetivo no campo moral (e, até, criminal). Primeiro: alguém, em sã consciência, pode negar que tem liberdade de parar esta leitura neste exato momento? Ou que pode desviar a vista até o topo da página antes de reiniciar? O que falar sobre levantar ou não o braço? No aspecto moral, se somos “maquinas biológicas” movidas por reações químicas, então os presos devem ser soltos, pois, afinal, eles não tiveram qualquer opção, a não ser cometer compulsoriamente o crime pelo qual foram condenados.
Outra coisa: como nosso corpo é físico, quaisquer manifestações no cérebro que comande nossos atos têm que, de alguma forma, ser (originado por) uma lei física (ou oriundo de um conjunto de leis). Todavia, para quem acha que sejamos mais do que uma porção de neurônios que "se acham" gente, a indução dos impulsos no cérebro (portanto, não os, propriamente ditos, impulsos neurais, de natureza física – elétrica) são manifestação da mente, ou alma se preferir [1].
Como já explanado em outro texto, acredito ser a mente a origem da matéria, não o oposto. O sistema nervoso central é, neste contexto, uma interface, um captor-transmissor, entre o corpo e a mente. É perceptível que, além das respostas do sistema vegetativo, algumas outras são gravadas, fixadas, no sistema nervoso (muitas vezes, por exemplo, um experiente motorista age, num caminho conhecido, sobre o carro de forma automatizada). Obviamente que se há dano nessa interface, sistema nervoso, toda a “conexão” é prejudicada.
A maneira que “os sinais” são trocados entre o mecanismo intermediário e a mente é descrito em aqui: tratasse de uma atividade no nível básico da matéria, no domínio da mecânica quântica. A percepção da manifestação da vontade da mente, consciência da decisão, pode ser percebida posteriormente.
Se concebermos que Deus existe e é onisciente, sendo este meu ponto de vista, a liberdade que Ele nos deu deve, necessariamente, estar em um nível acima (pelo menos) da criação do nosso universo (e o tempo neste contexto). A manifestação das decisões que tomamos enquanto não apresentados em atos no mundo físico é percebida como os impulsos nervosos que, cerca de meio segundo antes da tomada da consciência de uma decisão, são percebidos no cérebro.

2. “... podemos retraçar a história do universo de cima para baixo, ou seja, ir para traz partindo do tempo presente. (...) Criamos a história pela nossa observação, em vez de a história nos criar. (...) Nosso universo e suas leis parecem seguir um projeto feito sob medida e que, se for para realmente existirmos, deixa pouca margem para alterações.”.  

Hawking e Mlodinow propõem que todas as histórias possíveis do universo (bem como até as leis físicas que o definem) estão em sobreposição, como as trajetórias na experiência da DuplaFenda. O ato de observar, a medição quântica, é que define tudo aquilo que percebemos e o próprio universo em que vivemos. Assim, tal qual se constata uma medição qualquer no experimento da Dupla Fenda, as leis físicas e a história do universo que vivemos é definida. Por tal motivo, os autores postulam que é dispensável a existência de Deus para explicar o universo.

Contudo, quem observa? Quem constata que pode haver ou não um dado resultado? É a própria interação entre as partículas, as quais não estão sequer definidas?

A sobreposição de todos os resultados possíveis é desfeita na medição, essa redução de várias possibilidades para um resultado mensurável é dita “redução de estado” ou “colapso da função de onda”. Mas é fato que a mera iteração entre as partículas, por si só, não implica em redução de estado (ver a experiência da escolha retardada). Até o momento, a única candidata ao agente que provoca a redução de estado e que possibilita a concordância com as experiências realizadas em laboratório é dada pela hipótese defendida pelo físico, entre outros (poucos), Eugene Wigner: a consciência causa o colapso da função de onda.

Sem perceber, acredito, Hawking e Mlodinow propuseram um dispositivo circular, que leva a questionamento do tipo: “quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?”.


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[1] Um estudo a parte, futuramente, poderá melhor definir tais entes, mente e alma, de forma mais apropriada, Mas, no presente texto, não há prejuízo em sobrepor o significado de ambos.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

É o livre-arbítrio uma ilusão?


É exatamente isso que apontam alguns pesquisadores da área, como pode ser verificado nesta reportagem da revista Veja e, até, alguns físicos, como Stephen Hawking e Leonard Mlodinow, que afirmam: “É difícil imaginar como o livre-arbítrio poderia operar se nosso comportamento é determinado por leis físicas.” (Em O Grande Projeto). 

Em relação à citada reportagem, destaco:
Patrick Haggard, pesquisador do Instituto de Neurociência Cognitiva e do Departamento de Psicologia da Universidade College London, na Inglaterra, cita experimentos que comprovam, segundo ele, que o sentimento de querer algo acontece após (e não antes) de uma atividade elétrica no cérebro.
‘Neurocirurgiões usaram um eletrodo para estimular um determinado local da área motora do cérebro. Como consequência, o paciente manifestou em seguida o desejo de levantar a mão’, disse Haggard em entrevista ao site de VEJA. ‘Isso evidencia que já existe atividade cerebral antes de qualquer decisão que a gente tome, seja ela motora ou sentimental.’”

Lembrando:
Não acredite em autoridade, acredite na sua razão. Confronte sempre suas ideias com a realidade antes de determinar sua validade”.
Galileu Galilei

Primeiramente, vou comentar rapidamente dois aspectos, um subjetivo e outro objetivo no campo moral (e, até, criminal). Primeiro: alguém, em sã consciência, pode negar que tem liberdade de parar esta leitura neste exato momento? Ou que pode desviar a vista até o topo da página antes de reiniciar? O que falar sobre levantar ou não o braço? Sobre isso, escrevi mais em um texto aqui no blog. No aspecto moral, se somos “maquinas de carne” movidas por reações químicas, então os presos devem ser soltos, pois, afinal, eles não tiveram qualquer opção, a não ser cometer o crime pelo qual foram condenados. Mas passemos à outro enfoque, o qual julgo mais interessante frente a reportagem apontada..

O trabalho científico, a descoberta do processo físico enunciado no trecho da reportagem que destaquei acima, é digno de aplauso. Todavia, a conclusão apontada mostra certa lacuna de conhecimento ou deliberada desonestidade intelectual (considero a primeira hipótese). Antes de explicar essa minha opinião, vou abordar o que tal verificação empírica sinaliza diante dos conceitos que desfruto.

Como é dito na reportagem da Veja aqui apontada, um trabalho desenvolvido pelo psicólogo Benjamin Libert, em 2008, evidenciou que cerca de meio segundo antes de acusarmos consciência física de uma “decisão tomada” há um pico de estímulos nervosos no cérebro. Ou seja, as pesquisa mostra que há atividade no cérebro antes de uma decisão ser tomada. Daí, alguns concluem pela não existência do livre-arbítrio. 

Essa é uma interpretação a partir de fatos (sim, não é uma comprovação) que se choca com os ensinamentos cristãos de que o homem é livre. Afinal, se o homem não fosse livre, que culpa teria pelo “pecado” ou por qual motivo seria julgado? Verdade que desconheço citação direta na Bíblia que diga que a humanidade possui o livre-arbítrio, mas há várias inferências às nossas escolhas (e consequências das mesmas). Por outro lado, a onisciência divina (e a teoria da relatividade) nos leva a constatar que tudo está escrito. Como resolver essa dicotomia?

Não temos barreiras se alguém nós diz conhecer o passado (ao menos dentro de dada abrangência). Todavia, não se dá o mesmo em relação ao futuro. A razão é obvia: os acontecimentos passados estão definidos, estão inteiramente caracterizados no espaço e no tempo. Aqui é que está a solução á dicotomia: o tempo como passado (já escrito), presente (momento atual) e futuro (a ser escrito) é uma percepção limitada da humanidade, uma espécie de ilusão (como, grosseiramente, foi um dia a visão de que o mundo era chato, plano). Isso é fato, segundo pode ser verificado pela teoria da relatividade, nas palavras de Albert Einstein: “Para nós, físicos convictos, a distinção entre o passado, o presente e o futuro é apenas uma ilusão, ainda que persistente.”

Do ponto de vista da cabala, é fácil resolver o aparente problema. Mais ainda: os resultados dos experimentos descritos são esperados. O universo físico (matéria, espaço e tempo) é criado em uma ordem, em um desdobramento, final da criação: Assiá. O homem, Adão, do qual todos somos projeções, existe já em Beriá. A criação, seu princípio, meio e fim, está completa e acabada do ponto de vista do Criador. Do ponto de vista humano, estamos vivendo a mesma, tomando consciência daquilo que, livremente, optamos por fazer enquanto não encarnados.

Assim sendo, nosso cérebro recebe a determinação da mente do Adão (o que pode ser induzido por estímulos físicos, como descrito na experiência apontada na reportagem da Veja), a qual já está “particionada” desde Ietsirá (pelo menos), e, em seguida, “sente a vontade” de fazer algo.

A “máquina de carne humana” tem um piloto livre, o qual induz as decisões e todos os atos que estimulam nossa liberdade de escolha.

sábado, 1 de setembro de 2012

O Grande Projeto



Autores: Stephen Hawking e Leonard Mlodinow.
Ed Nova Fronteira participações S.A.

Síntese: Uma leitura muito agradável, empolgante, simples (para o assunto tratado), rica em ilustrações e com toques de bom humor. É difícil de fazer pausas durante a apreciação da obra. Os autores colocam os leitores a par das mais modernas teorias físicas. Com base nessas, respondem a questões fundamentais da existência.


Mais sobre o livro.



... como podemos compreender o mundo no qual nos encontramos? Como se comporta o universo? Qual a natureza da realidade? De onde veio tudo isso? O universo precisou de um criador?” Com esses questionamentos, os autores levantam a base da busca por respostas que norteiam o livro.
Embora essas perguntas sejam comuns na área da filosofia, Hawking e Mlodinow entendem que a filosofia não acompanhou o desenvolvimento moderno da ciência, da física em particular, e afirmam que os cientistas, e não os filósofos, estão mais aptos a darem tais respostas.
Desde a década de 1920, verificou-se que o senso comum, o bom senso (ao qual se adequa a física desenvolvida por Newton, por exemplo), deixou de ser um trilho na condução das teorias e propostas científicas, uma vez que se verificaram fenômenos que derrubavam qualquer tentativa de explicação que fosse comparável a fenômenos diretamente observáveis (ou seja, verificado dentro da amplitude visível diretamente aos nossos olhos, percebido pelos sentidos). A visão do “senso comum” passou a ser uma percepção amadora, ingênua, da realidade mais profunda. Deste quadro, nasce a mecânica quântica (e a relatividade).
A mecânica quântica reproduz os resultados macros (escalas maiores que moleculares), ou seja, da física apresentada por Newton, e de escalas atômicas e subatômicas. Isso mostra que as teorias desenvolvidas pela humanidade são, até onde sabemos, temporárias, pois estão passíveis de serem superadas por outra teoria mais abrangente e/ou mais precisa (lembra da teoria geocêntrica?).
Será que existe um arcabouço teórico unificado, uma teoria universal definitiva, que dê conta de todos os fenômenos verificáveis e que mostre que as teorias que temos hoje são aproximações, ou frações, dela?
A teoria-M é o único modelo com todas as propriedades que, cremos, deveriam constar numa teoria final.” Essa é a visão pela qual as respostas às perguntas iniciais serão conduzidas, dispensando, segundo os autores, a necessidade de um criador.
O texto segue com um sobrevoo pela evolução racional que nos traz a moderna ciência, passando pela Grécia e seus pensadores, Kepler, Galileu, Descartes, Laplace, Newton, Einstein, dentre outros. Três novas perguntas são apresentadas:
1.    Qual a origem das leis (da natureza)?
2.    Há quaisquer exceções às leis, isto é, milagres?
3.    Há somente um único conjunto possível de leis?
O que posso adiantar sobre as respostas a tais questões, para não estragar sua leitura do livro, é que os autores dispensam a hipótese “Deus” em suas explicações. Alertam ainda que: “Este livro é fundamentado no conceito de determinismo científico...”.
No capitulo 3, apresenta-se a relação entre teorias e realidade: “como sabemos que nós temos a imagem verdadeira da realidade, sem distorções?”. Os autores explicam como a teoria que dispomos implica na percepção que temos àquilo que chamamos de realidade: “Não há conceito de realidade independente de um quadro ou de uma teoria.” (essa característica interdependente entre o que se percebe a teoria utilizada para compreender tal percepção permite uma primeira incursão à teoria da mecânica quântica).
Assim, propõem o “realismo dependente”, onde “é inútil indagar se um modelo é real, apenas se concorda com as observações.”. Isso tem um impacto profundo naquilo que conceituamos como “existente”.
Com mais detalhes, o livro mostra as observações experimentais que levaram à mecânica quântica, aproveitando para, por meio de exemplos (até utilizando de comparações com eventos conhecidos), levar a uma compreensão geral dessa teoria. Em particular, chama atenção para o Princípio da Incerteza e o impacto deste na concepção do mundo subatômico: “Nosso uso de termos probabilísticos para descrever o produto de eventos do quotidiano reflete (...) nossa ignorância sobre certos aspectos dele. As probabilidades na mecânica quântica são diferentes. Elas refletem uma aleatoriedade fundamental na natureza.”. Isso leva a entender que o conceito de passado, como algo definido e imutável, deve ser revisto (ver a experiência da Escolha Retardada): “observações que fizermos de um sistema no presente afetam o seu passado.”.
O texto segue apresentando teoria de campo e alguns aspectos intrigantes da teoria da relatividade. Ao apresentar as quatro forças conhecidas da natureza, também aborda o esforço de unificar as mesmas num só arcabouço teórico, bem como a dificuldade de tal tarefa. Isso conduz à teoria das cordas e, em seguida, à teoria-M.
O conceito de multiverso (múltiplos universos) que emerge da teoria-M é utilizado para explicar a impressionante precisão das constantes físicas que possibilitam as forças que conhecemos (na forma precisa que as constatamos) e, em consequência, toda espécie de fenômeno verificado no universo. Ou seja, considerando inúmeros universos existentes, ao menos em potencial teórico, explica-se o motivo pelo qual o nosso existe em condições tão perfeitas para, bilhões de anos após o surgimento do mesmo, haver humanos para formularem questões sobre existência do próprio universo. Para os autores: “o universo apareceu espontaneamente, começando de todo modo possível.”. No contexto, a “seleção” do universo que vemos é feita de modo análogo à “seleção” que ocorre quando se observa a manifestação de uma dentre várias possibilidades de resultados relacionados à mecânica quântica: “podemos retraçar a história do universo de cima para baixo, ou seja, ir para traz partindo do tempo presente. (...) Criamos a história pela nossa observação, em vez de a história nos criar.”.
A adequação da natureza para a nossa existência é tomada ao avesso, ou seja: “Nosso universo e suas leis parecem seguir um projeto feito sob medida e que, se for para realmente existirmos, deixa pouca margem para alterações.”. Todavia, essa alegação leva os autores a divergir de que isso leva a uma hipotética ação divina, ao contrário do que a maioria de nós suporia.
“... a recente descoberta de que tantas leis naturais têm uma extrema sintonia fina pode levar ao menos alguns de nós de volta à velha ideia de que este grande projeto é obra de algum grande projetista. (...) Essa não é a resposta da ciência moderna.”. Hawking e Mlodinow concluem que o multiverso e, com ele, a sintonia fina das constantes físicas verificadas no nosso universo, pode ser visto como consequência da teoria-M quando esta trata do início do cosmo: “o conceito de multiverso pode explicar a sintonia fina das leis físicas sem necessidade de um criador benevolente que fez o universo em nosso benefício.”.
Do exposto, por fim, os autores concluem pela teoria-M como a “única candidata a uma teoria completa do universo.”.