domingo, 25 de novembro de 2012

O que ocorre em uma medição, segundo as interpretações da mecânica quântica.

Uma abordagem primária deste tema foi feita, de forma simplista, no meu texto O Enigma da Medição na Mecânica Quântica, neste blog. No presente artigo, pretendo fazer uma abordagem mais abrangente, mas resumida, sobretudo à luz explanações de textos do professor Osvaldo Pessoa Jr.
Uma apresentação mais completa (sobre física quântica) pode ser encontrada em [1] ou artigos do mesmo autor na Internet (link). 
A abordagem resumida deste texto, indicada no primeiro parágrafo, se dá devido ao foco ser como interpretações da mecânica quântica explicam a mudança do quântico para o clássico em determinados eventos: de uma descrição feita pela equação de Schrodinger (em que há uma multiplicidade de estados fisicamente viáveis, ou seja, um conjunto de possibilidades exequíveis, uma onda de possibilidades) para o que é efetivamente medido (apenas uma das possibilidades é verificada, um comportamento corpuscular) – conhecido como redução de estado ou colapso da função de onda (de forma realista ou positivista). Além disso, e descrito como algumas das interpretações descrevem essa “propriedade” na medição da experiência da escolha retardada.

(Figura extraída do livro O Tecido do Cosmo:. O espaço, o tempo e a textura da realidade, de Brian Greene, editora Companhia das Letras)

                a) Colapso da Função de Onda: Wener K Heisenberg explica que “cada determinação de posição reduz o pacote de onda de volta a sua extensão original”. A onda de probabilidade, assumida nesta interpretação como a descrição de algo físico, expande-se até o momento em que uma medição é feita. Daí, nas imediações de onde foi detectada a partícula, a onda se concentra, “exibindo” o potencial de 100% nestas mesmas imediações, enquanto em todas as outras posições, instantaneamente, o restante da onda probabilística tem seu valor reduzido à zero. Esta noção de “instantaneamente” é uma propriedade denominada por não localidade, um efeito não local em que, não interessa a distância de dada parte da frente de onda em relação à posição em que a partícula foi medida: fora da posição medida, a onda assume potencial nulo.
                Paul Dirac (em 1928) afirma: “Pode-se dizer que a natureza escolhe aquele dentre os estados que convém (...) A escolha, uma vez feita, é irrevogável e afetará todo o estado futuro do mundo”. Heisenberg critica a interpretação de que a natureza faz a escolha nos seguintes termos: “Eu diria, preferencialmente, conforme fiz em meu último artigo, que o próprio observador faz a escolha, pois é só no momento em que a observação é feita que a ‘escolha’ se torna uma realidade física  e que a relação das fases nas ondas, o poder de interferência, é destruída.”.
                Assim sendo, por exemplo, no caso da experiência da escolha retardada, o fato de colocar e ligar um detector (ver figura 7.2) nas possíveis trajetórias do fóton (ou elétron) permite o observador saber por qual caminho passa esta partícula, e, neste momento, ocorre à redução de estado e a medição é concluída. Numa análise mais abrangente, ao se ligar o detector, pode-se dizer que o cientista prepara o experimento de acordo com um comportamento esperado condizente com uma partícula clássica. Caso o detector não esteja ligado, o experimento está preparado para verificar um comportamento de onda.
                b) Muitos Mundos: a interpretação dos estados relativos de Everett (1957), ou muitos mundos, postula que todo o universo pode ser descrito por uma função e onda. Assim, no momento de uma dada medição, há um desdobramento do universo, de forma que cada observador (o pesquisador se desdobra junto com o universo, obviamente), que estará presente nessas “realidades”, registra em sua memória apenas um dos resultados possíveis (os estados mentais, as informações na consciência do observador, também estão em sobreposição, também exibem um conjunto de estados possíveis segundo a observação a ser feita). Como não há troca de informação entre os “mundos”, o observador fica com a impressão de que somente o resultado que ele presenciou se tornou uma realidade.
            Retomando o caso da experiência da escolha retardada, o fato de colocar e ligar um detector (ver figura 7.2) faz com que o universo “bifurque” em duas realidades, quebrando a sobreposição dos dois caminhos possíveis. Em uma delas, o detector é acionado, indicando que a partícula passou pelo mesmo. Na outra, o detector não emite qualquer sinal, indicando que a partícula passou pelo outro caminho. 
                c) Transacional de Cramer (1986): essa variação de interpretação é mais trabalhosa de se expor. Mas, resumidamente, pode-se dizer que há múltiplas emissões de ondas, tanto da parte que consideramos fonte em um experimento quanto do sensor com o qual a partícula venha a se chocar. Essas ondas são emitidas nos sentidos contrário e convencional do tempo (passado e futuro). Há uma série de cancelamentos das ondas de forma que só observamos aquela que vai da fonte até o detector. Essa série de emissões e interações é denominada de transações. Um aspecto “negativo” é a previsão de ondas vazias, ou ondas de energia zero.
Analisando o caso da experiência da escolha retardada, o detector ligado (ver figura 7.2)  ou parte do sensor neste, “troca” ondas com a fonte (transações), e ocorre o cancelamento de estados não observados.

d) Localizações Espontâneas:  neste caso, tudo ocorre muito parecido com a explicação dada no item a), menos no que concerne ao observador. A redução, neste caso, não se origina pela consciência do observador, mas, segundo o professor Osvaldo Pessoa Jr “é uma redução sem causa, uma redução espontânea, uma instabilidade intrínseca à natureza.”. Cada partícula teria uma probabilidade não nula, mas muitíssimo pequena, de entrar em colapso quando “livre”. Todavia, quando ocorrem interações, tal possibilidade de redução alcança valores extremamente elevados.
No caso da experiência da escolha retardada, o detector ligado (ver figura 7.2) implica numa ação sobre a onda em deslocamento que leva ao colapso espontâneo (a probabilidade de redução sobe sobremaneira).

2. Interpretação Corpuscular Realista: assume-se aqui que a medição é fidedigna, revelando a posição da partícula. Não há onda neste caso. Na medição, não há mudança de qualquer propriedade: a chamada redução de estado traduz um conhecimento mais preciso que o observador passa a ter sobre a partícula. Há muita dificuldade desta interpretação na explicação do comportamento ondulatório. Uma forma mais elaborada desta interpretação é conhecida como interpretação dos coletivos estatísticos
Todavia, Osvaldo Pessoa Jr alerta: “... o processo de medição não meramente seleciona um ‘sub-coletivo do coletivo inicial’, mas, ao fazer essa seleção, transforma as propriedades dos átomos [nota: partículas, como fótons e elétrons também, caberiam nesta descrição] do sub-coletivo (que a interpretação postula existir inicialmente), compondo assim um novo coletivo com propriedades não contidas no sub-coletivo inicial (devido, poderíamos dizer, a um distúrbio provocado pelo aparelho no objeto quântico ...).”.
Essa interpretação, como já mencionado, tem dificuldades na interpretação de fenômenos ondulatórios. Para a experiência da escolha retardada (ver figura 7.2)  a dificuldade de explicação aumenta em relação à descrição da quebra de interferência. Osvaldo Pessoa Jr explana: “Esta visão já tem dificuldades em explicar a interferência para um elétron ou fóton único, quanto mais para explicar o presente problema! Os detectores simplesmente revelam as posições pré-existentes das partículas. Mas por que a interferência desaparece?” Note que quando o detector está ligado, mesmo que a partícula vá pelo caminho em que não há detector, há alteração no “fenômeno” do movimento do fóton, pois não é apresentado o padrão de interferência.

3. Interpretação Dualista Realista: a medição é vista como mera detecção da partícula que é conduzida pela onda piloto. Novamente, explica Osvaldo Pessoa Jr “David Bohm ressalva que o ‘potencial quântico’, que corresponde às ondas em seu modelo dualista, sofre ‘flutuações violentas e extremamente complicadas’ durante a interação do objeto quântico com o aparelho de medição, afetando o momento da partícula e consequentemente sua posição final.”.
No experimento da escolha retardada (ver figura 7.2)  uma possível elucidação é que, uma vez que a onda guia segue por ambos os caminhos, o detector ligado provoca um distúrbio imprevisível, dependente do medidor, na onda piloto (na “parte” desta) que caminha pela trajetória coberta pelo detector. Daí, quando os dois ramos da onda (que seguiu por ambos os trajetos) se encontram novamente, cada parte se comportando como uma onda distinta (devido à perturbação em um dos “ramos”) e, em consequência, pode haver todo tipo de interferência. O padrão de interferência aleatório para cada detector resulta, em média, em 50% de possibilidade para cada detector medir uma partícula. Assim sendo, é a ação do  detector que provoca a perda de coerência (sobreposição de estados que possibilita exibir o padrão de interferência).

4. Interpretação da Complementaridade: o aparelho de medição causa um distúrbio incontrolável sobre o objeto quântico, ocasionando uma redução brusca e imprevisível do estado quântico durante a medição propriamente dita. Assim, pode-se dizer que quando há tal distúrbio, o fenômeno é corpuscular. Não havendo o mesmo, o fenômeno é ondulatório.
Em consequência, na experiência da escolha retardada (ver figura 7.2) o detector, uma vez ligado, interage com a partícula, seja em que caminho for, e isso provoca a redução. Assim, tem-se um fenômeno corpuscular (detector ligado).

_________________________________________________________


[1]  Conceitos da Física Quântica, Osvaldo Pessoa Jr, volumes 1 e 2, Editora Livraria da Física.

Nenhum comentário:

Postar um comentário