terça-feira, 30 de outubro de 2012

Magia


Complementando meus comentários e concepções a respeito da cabala, julgo por bem enfatizar alguns pontos.

Primeiro, retomo ao conceito de Deus, o Deus oculto, aquele associado ao nada. Estas páginas são testemunhas dos meus cuidados ao tentar passar parte de minha tênue noção de como é difícil uma descrição do Criador. Mas isso não significa que você não possa conhecê-lo, pelo menos sua face mais tangível a nós. Porém, trataria de uma experiência profundamente pessoal, a qual, em sua plenitude, não seria possível transmitir a ninguém mais. Sobre o assunto, deixo um paralelo da tentativa de se caracterizar Deus em função de nossos conhecimentos: as experiências cotidianas que estamos acostumados é tão apropriadas nesta descrição do Criador quanto um juiz tentar promover o julgamento da guarda de uma criança, a fim de entregar esta a um dos pais, utilizando-se de um código de trânsito.

Em segundo lugar, foco a sua atenção no fato de estarmos tratando, neste pequeno artigo, de uma geração, um ser vivo: a criação. É mister que o leitor compreenda que todos aqueles mundos, ou planos, bem como as sephirot, são seres conscientes, dotados de poderes singulares, verdadeiros deuses diante de nós humanos. A cada passo que descrevi quando apresentei os níveis em que se desdobrava a criação, deve ser entendido de forma análoga a um ser que gera o outro: é uma alteração, uma transformação, de parte de sua própria substância (na falta de um termo mais apropriado).

Como terceiro ponto, venho solicitar que o leitor se lembre de que todas as comparações que fiz são meros recursos didáticos. Tentei usar mais de uma para que você tivesse uma noção mais global do objeto da explicação. O ponto mais importante é que não se pode entender que um novo plano passe a existir em um espaço que preexiste, pois tal espaço só vem a existência com o próprio plano recém criado. No texto sobre o Mundo de Atsilut, quando usei uma figura para abordar "A primeira quebra de simetria", alguns podem ter se confundido achando que o Criador atravessa uma “substância” e se projeta num espaço já existente, interpretação permitida pela ilustração. Não é desta forma. O entendimento daquela passagem está muito mais próximo do fato quando me utilizo da ideia - lembre-se que estamos numa realidade produzida pela mente - da construção de uma casa: cada fase advêm a existência no mesmo espaço mental, sem destruir a fase anterior, e em consequência direta desta.

Por fim, como bom estudante de cabala, ressalto que esse assunto, essa ciência, requer prática. Aqueles que queiram se aprofundar nos estudos deste tipo (o assunto está longe de ser abordado aqui no seu aspecto mais amplo) devem testar o que recebem como ensinamento. Não acredite: teste e veja se funciona. A cultura esotérica, o conhecimento sem aplicação, leva a devaneios, alimenta mentes férteis (por vezes fracas) e descompromissadas com a realidade.

A magia é uma ciência prática e consiste em conhecer e manipular (na verdade, fazer uso para transformar a vida própria) as leis naturais, leis estas que estudamos aqui, ao menos em parte. Um bom estudante de cabala é um mago em potencial. Um praticante dos ensinamentos que se originam nessa tradição esotérica é um mago.

Existem exercícios, meditações e práticas específicas descritas em bons livros sobre o assunto. Lembre-se de nunca estudar só e ter um bom instrutor, professor, rabino ou mestre (alguém que mostre resultado prático naquilo que está passando a você).

Boa sorte!

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Três Caminhos para a Gravidade Quântica


Por Lee Smolin
Editora Rocco

Opinião

O livro é bom, consistente, esclarecedor, mas seu linguajar é, ocasionalmente, um tanto técnico, com alguns modelos matemáticos utilizados de forma simplificada, não sendo de fácil leitura para todos. Todavia, mesmo para quem achar que a leitura é difícil, o esforço vale pelo conteúdo, objetividade e informações sobre a moderna física.


Mais sobre o livro

O autor inicia sua abordagem por aspectos básicos do tempo e espaço, bem como sobre a matéria. Daí introduz o conflito entre as duas teorias mais bem sucedidas da física: relatividade geral e mecânica quântica.

Smolin cita os trabalhos mais promissores que visam uma solução para esse embate entre ambas teorias: a teoria das cordas e a gravidade quântica com loops, ou laços. A solução para tal conflito reside numa unificação teórica. Além disso, situa sua pesquisa, frente a estes dois últimos trabalhos, como intermediária.

Um terceiro caminho é ventilado pelo autor, “trilhado por pessoas que consideram a relatividade e a teoria quântica defeituosas e incompletas demais para serem pontos de partida aceitáveis”.

Isto posto, declara que percorrerá os 3 caminhos em sua obra.

O capítulo seguinte é dedicado às relações e à compreensão a respeito do espaço e do tempo. Em particular, o autor explica que “O tempo nada mais é do que uma medida da mudança”.

Em seguida, mostra como a intuição comum da diferença entre o observador e o sistema estudado pode não ser tão nítida. As interpretações da mecânica quântica são abordadas, assim como o princípio da incerteza e uma versão do paradoxo do Gato de Schrödinger.

Portanto, não existem de fato duas categorias de coisas no mundo: objetos e processos. O que há são processos relativamente rápidos e processos relativamente lentos.”. O autor explica e exemplifica que as coisas não são, do ponto de vista de amplas escalas do universo, elas estão: o universo se caracteriza por um enorme número de eventos. O horizonte de eventos (delineado pela velocidade da luz) define o alcance das informações que comunicam etapas de um mesmo evento ou, até mesmo, eventos aparentemente diferentes. Este horizonte, os cones de luz determinado por eles, é que delimitam as relações de causa e feito que observamos. Em seguida, uma introdução à explicação de um universo discreto no espaço e no tempo, ou seja, com unidades mínimas de medida do espaço e tempo, é apresentada.

O autor aborda o estudo da singularidade conhecida por buraco negro. A abordagem é original e levanta comparações interessantes. Neste contexto, aborda a entropia, a lei de Unruh e a Lei de Bekenstein.

Smolin explica a associação da entropia de buracos negros com o horizonte de eventos associado ao mesmo.

Uma abordagem mais detalhada sobre “átomos de espaço”, ou seja, sobre um espaço descontínuo, discreto, é feita. Para tal, uma “visita” aos primórdios da mecânica quântica é realizada.

A gravidade quântica em loops descreve um espaço descontínuo. No contexto, a abordagem de partículas e campos como fundamento da matéria é descortinada. Essa teoria permite harmonizar alguns conflitos da física.

A abordagem adotada leva a explicação sobre rede de spin, sua utilidade e vantagens. Essa parte é ricamente ilustrada por figuras.

Em seguida, a teoria das cordas é abordada: “a teoria das cordas é a única maneira conhecida de unificar, de forma coerente, a gravidade com a teoria quântica e as outras forças da natureza.”.

O princípio holográfico e sua repercussão no estudo do universo são mostrados ao leitor.

O fim do livro é dedicado a observações de Smolin que buscam uma unificação dos pontos fortes das teorias apresentadas nos capítulos anteriores. A abordagem do multiverso é abordada na parte final.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Liberdade



Mágica é qualquer tecnologia suficientemente avançada.
Arthur C Clarke

Algo de suma importância precisa ser abordado aqui: a liberdade. O mito da criação judaico-cristão lança a liberdade humana como um presente precioso que Deus respeita e cultiva no homem.

Adotando uma interpretação próxima a do professorAmit Goswami, quando ele diz que a realidade é fruto da decisão do homem, ou melhor, da mente única, podemos entender o quão fundamental é tal liberdade para a existência do mundo que partilhamos.

As experiências científicas da dupla fenda e da escolha retardada indicam que o ato de medir traz algo do “quântico” para o “clássico”. Posição, tempo e espaço são “nuvens” de probabilidade em termos subatômicos. O princípioda incerteza mostra a natureza flutuante da “matéria”. As equações da mecânica quântica, em uma de suas mais famosas e aceitas interpretações, aponta para a sobreposições de estados: a coexistência de múltiplas possibilidades, com probabilidades diferentes para cada uma destas. Só uma será existirá na medição.

Veja a importância deste comportamento. A ideia de que, a nível básico físico, existe um mar de probabilidades que constitui a realidade leva o conceito de “liberdade do homem” a um patamar nunca imaginado. É como se a base da matéria fosse uma massa pronta para ser trabalhada a gosto de seu modelador, como argila nas mãos de um escultor.

Segundo os cálculos da teoria das cordas, se não existisse tal flutuação, se não existisse a incerteza - resultando em intensa agitação a nível subatômico - as energias da corda fundamental corresponderiam a uma massa de 10 bilhões de bilhões (10 elevado a 19) de vezes maior que de um próton. Detalhe: o próton é composto por três quarks (fundamentais).
O que isso quer dizer? Significa que sem esta flutuação o universo físico estaria longe de ser como o conhecemos, provavelmente nem existiria. O nível de energia mínimo da matéria seria absurdamente alto, causando um colapso gravitacional. Em suma, a liberdade ampla e irrestrita é parte da natureza da matéria porque sem ela as coisas não existiriam como as conhecemos. O mundo das divisões, do limite, do “eu” e “você” precisa da liberdade para existir mesmo nos seus alicerces mais básicos.

Comecei esta seção remetendo a interpretação do mito judaico-cristão da criação. Ainda neste, quero expor que me alinho com aqueles que consideram a criação como um ser consciente. A escala gradual que apresentei descreve como saímos de energias poderosíssimas e chegamos a um nível de existência onde a multiplicidade é plena e passa a dominar as relações. Pode-se interpretar estes planos conscientes da criação como deuses: seres de grande poder capazes de moldar a realidade onde vivem.

Quando é citada a criação do homem no mito bíblico, fala-se de um ser do qual todos derivamos: a mente única que molda o universo, segundo Goswami. Importante: não vejo Deus, o Criador Imanifesto, o nada cabalístico, como aquele que molda esta realidade física que experimentamos. Minha interpretação é de que o homem molda esta realidade.

Nesta concepção, a liberdade dada por Deus ao homem se manifesta em todos os níveis. Isso explica o princípio da incerteza. A Árvore da Vida é o homem: imagem e semelhança do Criador. Se cada “tijolo” básico da matéria é uma percepção desta estrutura básica da criação, a liberdade de mudar seu estado, a qualquer momento, é inerente também à existência do mundo subatômico: fótons, elétrons, quarks, etc. No nível elementar de nossa realidade física, essa identidade do homem com a estrutura de seu universo impede a separação da influência do cientista sobre o experimento conduzido.

Sem a liberdade para a criação, a multiplicidade não seria possível: o universo entraria em colapso.

sábado, 6 de outubro de 2012

Eventos


O universo é feito de processos, não de coisas.”
Lee Smolin

Os hebreus antigos não usavam a expressão “eu sou” – Ehyeh (em dadas traduções). Esta era exclusivamente atribuída a Deus, aquele que “é”, imutável e perfeito. Os homens eram considerados “não são”: estão em aprendizado, em eterna mudança. Estes pensamentos são evidentes na época em que Jesus viveu, pois um dos ditos que mais escandalizou a sociedade dos hebreus, sobretudo os sacerdotes daquela época, foi a afirmativa do rabino nazareno: “Estou lhes dizendo antes que aconteça, a fim de que, quando acontecer, vocês creiam que Eu Sou.” (João 13-19).

Uma análise simples, física e psicológica, mostra que de fato nós não somos, mas estamos. Nosso corpo é alterado através do tempo em muitos sentidos, inclusive na troca dos átomos: dos que nos compõem hoje, poucos restarão em 15 anos, e, talvez, nenhum em 30 anos. Nossa mente também muda, transforma-se: a cada informação e experiência que acumulamos a forma de analisarmos e reagirmos é redefinida. Analisando o que esperávamos da vida ou algumas reações nossas de 10 anos atrás, verificamos que há divergência com o momento presente. Há um dinamismo implacável na vida.

Isso é percebido inclusive na descrição pessoal. Se alguém quiser conhecer uma pessoa com profundidade, as características físicas pouco serão úteis. Contudo, como ela age e pensa é indispensável. As experiências e atitudes que o indivíduo tomou frente aos problemas, nos momentos mais marcantes da vida dele, definiram a personalidade e os traços que permitem outros conhecê-lo. Um grande amigo(a) é aquele(a) que você conhece bem, ou assim pensa, e cuja atitudes lhe agradam. Conhecer bem uma pessoa raramente é sinônimo de saber quais são suas características físicas.

Fazendo uma análise no tempo, com raríssimas exceções, os personagens histórico ficaram marcados por seus atos, pelas atitudes que tomaram, ou deixaram de tomar, na condução da vida que abraçaram.

No universo, algo similar acontece. Nosso planeta gira sobre si mesmo e em volta do sol. Os outros planetas do sistema solar também giram ao redor desse. A nossa estrela, assim como muitas outras, gira orbitando o centro de nossa galáxia. A Via Láctea se move no espaço, junto com bilhões de outras galáxias. Existem os aglomerados de galáxias, que também estão em movimento. O próprio tecido do espaço-tempo é dinâmico e está em expansão acelerada, segundo modernas observações.

Para contarmos a história do nosso universo, definir posições e aparência de astros celestes não é suficiente. Tem-se que apresentar os eventos, os movimentos dos astros, as explosões e implosões que iluminam o céu. Retratar a riqueza do dinamismo desde o Big Bang é fundamental na descrição de um universo que tem como constância a eterna mudança.

Posto assim, cito com admiração os hebreus, pois, há milênios, sabiam que não “somos” e sim “estamos”. O imutável, perfeito, é atributo de Deus, não do universo que interagimos.

Eventos e dinamismos são tão importantes em nosso universo que vemos e interpretamos segundo aquilo que vivenciamos. Esta dedução não é aplicável somente ao caráter psicológico, como análise segundo os valores que adquirimos na vida. Espaço, tempo, massa, de acordo com a teoria da relatividade e experiências correlacionadas a essa, dependem do observador e sua relação, em termos de movimento e aceleração, com o que está sendo observado. Para dois observadores com movimento relativo entre si, eventos simultâneos para um pode não o ser para o outro.


Na física quântica, o comportamento de um experimento pode variar como partícula ou onda conforme se observa o mesmo. A maneira que se escolhe fazer a medição é decidida pelo cientista.

Em resumo, pode-se dizer que os eventos, as correlações e as interações, são fundamentais para descrever a nós e o universo físico. Além disso, é a mudança de relação daquilo que descreve o espaço, ou seja, da matéria e energia, que origina o tempo.